Por conta da pandemia de Covid-19, alguns efeitos que já eram importantes e não eram tratados com a devida atenção, podem voltar à tona neste momento: é o caso da mobilidade urbana sustentável.
Mobilidade urbana sustentável
No caso do Brasil, podemos destacar a real necessidade de implementar um sistema de mobilidade urbana sustentável. Em suma, as cidades poderem ter a capacidade de prover modais adequados para que a população possa transitar de forma eficiente, barata e conveniente. E que também esses sistemas estejam conectados às localidades e aos seus elementos naturais. Ou seja, que este movimento não acabe após a pandemia e que um novo modo de pensar sobre os transportes nas grandes cidades venha para ficar.
No meio do período de quarentena um dos meios de locomoção mais utilizados pelos brasileiros foi a bicicleta.
Transportes X mobilidade urbana
De acordo com o presidente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), Ailton Brasiliense Pires, que neste momento de distanciamento social só chamou mais atenção um problema que além de antigo, já era precário:
“O modelo atual de transporte das cidades não pode se sustentar, seja do ponto de vista ambiental, seja quanto às receitas necessárias para mantê-lo em funcionamento com mínimas condições de qualidade e modicidade tarifária.”
Já para o especialista em inovação, Arthur Igreja, existe um fator ainda mais desafiador ao propor a implantação de um sistema de mobilidade sustentável nos dias atuais nas cidades brasileiras: no decorrer do tempo, muitos municípios não terem se planejado para ter o tamanho que tem hoje, ou ainda optaram por rumos bastante confusos neste sentido:
“Além da falta de recursos, outro ponto de atenção é que no Brasil há muita disparidade e falta de cidadania, ou seja, quem anda de carro em um determinado trecho não se preocupa com o ciclista, por exemplo, o que é muito preocupante. Tudo isso deveria estar na agenda dos governantes.”
Papel do usuário
Em contrapartida, Igreja indica que é essencial o papel do usuário na definição de políticas de mobilidade urbana:
“O papel do usuário é ajudar a construir esse debate, haja vista que, muitas vezes, o gestor não consegue imaginar as necessidades na ponta e, consequentemente, tomam decisões sem levar em conta os diferentes pontos de vista. O usuário tem esse papel de participar ativamente. Por outro lado, há momentos que possibilitam a participação popular e pouca gente se mobiliza. Não dá para simplesmente reclamar sem tentar contribuir de alguma maneira.”
Projeto entre Udesc e Universidade de Veneza
Sendo assim, professores da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc) firmaram uma parceria com a Universidade de Veneza, na Itália. O objetivo da união é a coordenação do projeto “O papel do usuário na definição de políticas de mobilidade sustentável”, que visa analisar fatores que influenciam na escolha dos usuários pela opção de mobilidade que eles tomam em sua rotina diária.
Segundo o professor Daniel Pinheiro, coordenador do projeto, as escolhas para deslocamento nem sempre são tomadas pelo que o usuário deseja. Pelo contrário, muitas vezes é sobre aquilo que foi estipulado para que ele execute, ou as condições que a cidade proporciona à população.
“O nosso objetivo é colocar como protagonista desse papel, o cidadão que escolhe todos os dias como se deslocar na cidade. Se ele tem opção de escolher, se essa opção foi dada ou escolhida. Para aqueles que não têm opção de escolha, como eles veem o tipo de transporte que usam.”
Portanto, tais informações são fundamentais para que a pesquisa aponte alternativas de políticas públicas não apenas em termos de mobilidade. Mas também que englobe o conceito de mobilidade urbana sustentável, conclui o professor.
Estudo sobre mobilidade
O estudo sobre mobilidade teve início em 2016. Ele segue nas etapas de coleta de dados, com previsão para apresentação dos resultados em julho de 2021.
Pinheiro explica que na primeira fase, a pesquisa analisou, por exemplo, que embora o cidadão que utiliza o transporte público, quando pensa em trocar, não pensa em alternativas mais sustentáveis. E acaba optando como solução o uso do carro e ainda de modo individual.
Já na segunda etapa os pesquisadores adicionaram os transportes por aplicativo e perceberam que há uma tendência de optar por este meio de locomoção, ou seja, o usuário visualiza isso como uma alternativa:
“É importante a gente pensar nisso, porque qualquer processo de intervenção para mobilidade sustentável vai ter que levar em conta o fato de o usuário não visualizar novas possibilidades como viáveis alternativas. O que nos leva a refletir sobre por que investir em uma malha cicloviária, por exemplo, se não sabemos se o usuário vai adotar? Então, a partir dessas informações, podemos explicar para o poder publico que há uma necessidade de educação para o uso dessa malha cicloviária. E, isso não significa dizer que é bom ou ruim, significa dizer o que deve ser feito para conscientizar o cidadão. Esse é o nosso objetivo.”
*Foto: Divulgação