Impacto ambiental no transporte gera 9% das emissões totais de CO₂, mas apesar do avanço, empresas sustentáveis ainda são minoria no mercado, afirmam especialistas
Apontado como um dos maiores responsáveis pela emissão de gases de efeito estufa, o setor de transportes tem levado empresas a buscar alternativas menos poluentes e a olhar para a agenda ESG (sigla para meio ambiente, social e governança corporativa) como uma oportunidade de negócio.
Impacto ambiental no transporte
De acordo com informações do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), o setor responde por cerca de 20% das emissões globais de CO₂. No Brasil, segundo o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, é responsável por quase 9% das emissões totais.
Além disso, a empresa de logística CHEP Brasil, por exemplo, firmou uma parceria com a PepsiCo para fazer o reaproveitamento de veículos para movimentação de cargas. E para diminuir o impacto ambiental no transporte, ela faz a entrega de paletes para a PepsiCo, que os utiliza ao enviar os seus produtos aos distribuidores — sejam supermercados, atacadistas ou minimercados. Após a entrega, em vez de os caminhões retornarem vazios, eles carregam os paletes de volta para a CHEP por rotas estratégicas — ajudando assim a economizar os quilômetros rodados através da redução de entregas e o uso de trajetos. É o que explica Marcel Lopes, gerente da Cadeia de Suprimentos da CHEP:
“Assim, evito contratar mais veículos, reduzindo custo para nós e para eles, e evito de ter uma poluição maior, com menos veículos nas ruas.”
Transporte Colaborativo
Segundo estimativa da empresa, a parceria, batizada de Transporte Colaborativo, já ajudou a reduzir a emissão de mais de 1 milhão de toneladas de CO₂ na atmosfera. Sobre isso, André Cardoso, diretor geral da empresa no Brasil, ressalta:
“Sem a parceria, os caminhões da PepsiCo voltariam sem carga e nós teríamos que contratar outro veículo para buscar os nossos ativos, o que geraria o dobro de quilômetros rodados.”
A Ambev, que possui a maior frota de caminhões elétricos do País, também tem traçado estratégias na área. Em 2021, a empresa confirmou a compra dos 100 primeiros veículos elétricos e no ano passado ultrapassou o número de 250 que integram a frota da empresa. Segundo a companhia, a ação já ajudou a poupar o meio ambiente de 2,8 mil toneladas de emissões de CO₂.
Já a Eu Entrego, que tem como foco conectar varejistas com entregadores autônomos, em parceria com a Moss, faz com que todas as entregas terão compensação de 100% do carbono emitido na rota até o consumidor, reduzindo o impacto das emissões de gases de efeito estufa.
Para o CEO da companhia, Vinicius Pessin, em razão da ascensão do e-commerce na pandemia, é preciso olhar o impacto da quantidade de entregas. Portanto, para ele, o crédito de carbono é um modo eficiente de democratizar o acesso às soluções sustentáveis para empresas dos mais diversos portes.
Cenário de mudança já é realidade?
Para especialistas, apesar de já terem empresas com iniciativas em sustentabilidade, elas ainda são minoria no mercado de transportes — seja de cargas ou de passageiros.
Daniel Frantz, vice-presidente de Logística do Grupo Intelipost, destaca que houve avanços. Porém, eles são mais perceptíveis sobretudo no setor de logística, impulsionado pelo mercado de e-commerce, que ganhou uma relevância ainda maior durante a pandemia da covid-19.
“Os avanços são pequenos pelo tamanho do mercado, mas é uma evolução gigante quando a gente compara com dez anos atrás. Há dez anos não se falava de carros elétricos, caminhões elétricos, modais que não emitem CO₂. Quando a gente olha para hoje, essas iniciativas existem.”
Frantz aponta que as mudanças são consequência da ascensão da agenda ESG e da pressão dos consumidores, que exigem que as empresas sejam mais sustentáveis.
Poder público
Por outro lado, segundo o professor Marcos Zilbovicius, doutor do Departamento de Engenharia de Produção da Universidade de São Paulo (USP), para que este cenário se fortaleça faltam incentivos do poder público, mas também interesse da indústria privada.
“É incipiente o que tem de mudança. Acho que tem a possibilidade de ganhar escala, mas eles são pequenos ainda. Nós temos muitos problemas na área de transportes. A base no Brasil é rodoviária e ainda está muito longe de ter uma frota sustentável significativa, seja de carbono ou até mesmo híbrida. Não vejo nenhuma perspectiva disso a longo prazo.”
Ele completa que embora já tenha soluções sendo desenvolvidas para diversas áreas do transporte, inclusive no setor de logística. Para ele, faltam estímulos econômicos para que os proprietários de frotas e empresas mudem para uma alternativa mais sustentável.
“É preciso ter uma política forte de estímulo e castigo. Pode ser trazendo exigências sustentáveis para se obter financiamento, aumentar muito o imposto para as empresas que emitem carbono. Hoje isso não existe tanto para o transporte de cargas, quanto para o de passageiros.”
Desestimular o consumo
Por outro lado, ele destaca que é preciso onerar o uso do que se quer desestimular o consumo.
“Se tem a tecnologia disponível e as empresas não usam, a política pública pode interferir e transformar em mais barato. Aumentar o imposto do diesel e diminuir do elétrico.”
Ou seja, para que as empresas deixem de usar funcionalidades poluentes, é preciso encarecê-las.
Por fim, Zilbovicius afirma que a junção dos atores públicos e privados é crucial para uma mudança significativa.
“A questão ambiental entra com força quando a economia diz que vale a pena. As empresas existem para ganhar dinheiro, mas elas podem ganhar dinheiro contribuindo ou não com a questão ambiental. Quando você coloca na equação econômica, tem que ficar muito caro não emitir carbono para haver uma mudança significativa.”
*Foto: Reprodução/br.freepik.com/fotos-gratis/carro-de-desenho-animado-e-sinal-de-reciclagem-na-grama_8726657